Sociedade em Conta de Participação é alternativa para captação de investimentos. Saiba como funciona!

Composta por dois tipos de sócios, a SCP é uma opção interessante para viabilizar projetos específicos

Sergio Luiz Beggiato Junior

A legislação brasileira traz diversas alternativas para empreendedores em busca de investidores, como o contrato de investimento anjo, o mútuo conversível em participação societária e o equity crowdfunding, cada uma delas com seus próprios riscos e vantagens.

Outra opção bastante utilizada no mercado é a Sociedade em Conta de Participação (ou apenas “SCP”), já prevista em lei desde 1850 e regulamentada pelo Código Civil de 2002 (além de presente no Marco Legal das Startups).

Apesar do nome, a SCP não é exatamente uma “sociedade”, uma vez que não existe a constituição de uma nova empresa entre os sócios. Trata-se, em verdade, de uma figura mais próxima a um contrato de investimento, em que um sócio exerce a atividade empresarial (o sócio ostensivo) e o outro sócio (o sócio participante) realiza investimentos para o desenvolvimento do negócio.

A SCP, aliás, é muito utilizada não apenas para investimento direto em novas empresas ou negócios, mas também para financiamento de projetos específicos dentro de uma empresa já existente, ou no mercado de construção civil.

Como funciona uma SCP?

A Sociedade em Conta de Participação, como mencionado, possui dois tipos de sócio: o sócio participante (que é o investidor) e o sócio ostensivo (a empresa investida).

O sócio participante é por vezes chamado de sócio “oculto”, uma vez que seu papel na SCP é apenas o de prover recursos (normalmente financeiros, mas também podendo atuar como advisor, conselheiro consultivo ou mentor) ao sócio ostensivo. O sócio participante não pode atuar como um representante da empresa perante terceiros. É por isso, aliás, que também é chamado de sócio “oculto”, já que ele não “aparece” ao mercado.

O sócio ostensivo (que pode ser tanto uma pessoa física quanto uma empresa já  constituída, daí porque a SCP ser muito utilizada para financiamento de startups) é quem vai exercer as atividades empresariais, assumindo direitos e obrigações e se relacionado com o mercado.

Há, portanto, uma clara divisão de tarefas em uma SCP – e que também oferece uma proteção ao investidor, uma vez que somente a empresa investida responde perante terceiros pelas obrigações assumidas. Por essa razão, a SCP mostra-se uma alternativa interessante para investidores, já que seu patrimônio pessoal não poderá ser utilizado para o pagamento de dívidas da empresa investida (desde que, claro, as regras legais sejam respeitadas).

Essa proteção, contudo, depende de algumas cautelas. A primeira delas é a proibição de o investidor tomar parte nos negócios da empresa, apresentando-se ao mercado ou a terceiros como representante ou administrador, por exemplo. O papel do sócio participante é “interno” à SCP, realizando os investimentos acordados (e, quando previsto em contrato de SCP, prestando serviços).

O segundo ponto a ser observado é a necessidade de se formalizar as atribuições e responsabilidades de cada sócio em contrato escrito. Ainda que a legislação preveja que a SCP se constitui independentemente de qualquer formalidade, e “pode provar-se por todos os meios de direito”, a existência de um contrato escrito é fundamental para evitar disputas futuras entre os sócios, ou destes com terceiros (como clientes, empregados e fornecedores).

É no contrato de constituição da SCP que ficarão definidas regras como o valor do investimento, prazos e condições para os aportes, forma de distribuição dos lucros, regras para prestação de contas, resgate do investimento etc, bem como os limites da atuação do investidor.

O estabelecimento de regras sobre a atuação do investidor junto à empresa investida, aliás, é uma garantia “de mão dupla”, protegendo tanto o sócio participante quanto o sócio ostensivo: para o investidor, é a forma de preservá-lo contra a responsabilização por dívidas ou obrigações contraídas pela empresa; e, para a investida, é a maneira de evitar ingerências indevidas sobre a gestão e os negócios da empresa.

E como o investidor obtém seus retornos?

O nome “Sociedade em Conta de Participação” significa que o investimento realizado deverá formar um “patrimônio especial”, exigindo uma contabilidade específica sobre essa “conta de participação” nas demonstrações financeiras da empresa investida.

Nessa “conta de participação”, deverão ser lançadas as receitas e despesas relacionadas ao investimento do sócio participante, e é do resultado dessa “conta” (contábil) que sairá o lucro do investidor.

Porém, a própria lei estabelece que essa especialização patrimonial só tem validade perante os sócios da SCP, já que, pela regra da responsabilidade patrimonial universal, todo o patrimônio da empresa investida responde pelas obrigações contraídas com terceiros.

E isso é um elemento importante que reforça a importância de um bom contrato escrito para a SCP, a fim de mitigar o risco do investimento: é por meio de regras claras sobre fiscalização do negócio e prestação de contas que o investidor terá maiores garantias de que o sócio ostensivo está conduzindo adequadamente os negócios, e não dilapidando o investimento realizado.

A SCP, conforme explicado, é uma alternativa muito interessante para estruturar investimentos e viabilizar projetos específicos. Mas, como toda operação societária, exige cautelas jurídicas e contratos robustos, sempre personalizados para cada operação.

Sergio Luiz Beggiato Junior é advogado no escritório Rücker Curi – Advocacia e Consultoria Jurídica.