Recurso essencial quando o assunto é proteção patrimonial, o testamento é uma ferramenta legal que garante que o desejo do testador seja cumprido e evita conflitos familiares
Izabela Rücker Curi
É possível decidir o destino dos próprios bens materiais após a morte e evitar conflitos familiares. Para isso, existem os testamentos! Recursos essenciais quando o assunto é proteção patrimonial, eles são ferramentas legais que garantem que a vontade do testador seja cumprida, evitando litígios prolongados ao designar herdeiros, definir a distribuição de bens e até mesmo estabelecer a criação de fundações ou doações.
No Brasil, existem os testamentos ordinários. Eles se subdividem em três formas: Testamento Público, escrito por tabelião em cartório de notas, de acordo com as declarações do testador e na presença de duas testemunhas; Testamento Cerrado (ou Secreto), escrito pelo próprio testador (ou por outra pessoa designada por ele) e aprovado e lacrado em invólucro por tabelião de cartório de notas, sendo aberto por juiz somente após falecimento; e Testamento Particular (ou Hológrafo), escrito e assinado pelo próprio testador, na presença de três testemunhas, sem necessidade de ser levado a cartório.
O Testamento Particular, para ter validade após a morte, precisa ser confirmado em juízo pelas testemunhas. Caso estas não sejam localizadas ou não se lembrem do conteúdo do documento, o mesmo pode ser invalidado. Em relação ao Testamento Cerrado, o principal risco é a morte ou a recusa da confirmação da autenticidade por parte do tabelião ou das testemunhas, o que é capaz de torná-lo nulo. Além disso, por ficar sob a guarda do próprio testador, há risco de ser danificado, extraviado ou violado. Assim, pode-se considerar que a ferramenta mais segura e com maior validade jurídica é o Testamento Público.
Independentemente do tipo, o testamento deve sempre respeitar a sucessão legítima (também chamada sucessão legal), ou seja, a parte da herança que a lei reserva aos herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge). Isto quer dizer que o testador só pode dispor livremente de 50% de seus bens, podendo assim favorecer pessoas mais necessitadas, com ou sem grau de parentesco.
O documento permite reforçar a proteção do cônjuge (por exemplo, legando bens que não entrariam na meação) e também beneficiar companheiros em união estável que ainda não tenham formalização documental, reduzindo risco de litígios. Ele possibilita planejamento para filhos menores ou com necessidades especiais, estabelecendo nomeação de tutor em caso de falecimento de ambos os pais e destinação de recursos para garantir tratamento, educação e bem-estar de filhos com deficiência (inclusive criando usufruto ou condições para uso do patrimônio).
Existem cláusulas usadas para proteger herança de filhos endividados ou com histórico de má administração de bens, como as cláusulas da incomunicabilidade (bem não entra na comunhão em caso de casamento ou divórcio do herdeiro), impenhorabilidade (para evitar que bens sejam usados para pagar dívidas do herdeiro) e inalienabilidade (proíbe venda ou doação do bem por determinado período). Também pode haver reconhecimento de filhos nascidos fora do casamento (art. 1.609, II, CC) e beneficiamento de pessoas com outros vínculos afetivos, como por exemplo enteados que não foram formalmente adotados.
É uma boa solução para situações de famílias recompostas, organizando a distribuição de bens entre filhos de diferentes relacionamentos e podendo resguardar patrimônio para filhos do primeiro casamento sem deixar de beneficiar o cônjuge atual. O testador também pode igualar ou compensar doações feitas em vida, garantindo que todos os herdeiros recebam quinhões equilibrados. É possível dispor sobre colação (dispensa ou exigência) para evitar litígios na partilha.
Em casos de empresas familiares, o testamento é capaz de garantir continuidade ao designar quem ficará com as cotas ou ações, evitando assim que herdeiros que não têm interesse participem da gestão. Pode prever usufruto de lucros para determinados herdeiros e propriedade para outros, preservando o controle societário. Além disso, é possível beneficiar terceiros ou instituições, destinando (dentro da parte disponível), por exemplo, parte do patrimônio a ONGs, fundações, igrejas, universidades, empregados de confiança ou amigos.
Para garantir que o documento seja válido, atenda a seus desejos e evitar problemas futuros, é sempre importante buscar auxílio de um advogado especialista em direito de família e sucessões. A falta de planejamento torna a sucessão patrimonial inflexível. Por isso, não hesite em procurar um bom profissional da área de Direito e evitar que seus bens fiquem à mercê de normas genéricas e possíveis desentendimentos.
*Izabela Rücker Curi é advogada, sócia fundadora do Rücker Curi – Advocacia e Consultoria Jurídica e da Smart Law, startup focada em soluções jurídicas personalizadas para o cliente corporativo. Atuante como conselheira de administração, certificada pelo IBGC.