O uso das ferramentas no ambiente empresarial não pode ser suprimido. Porém, a comodidade não deve levar as empresas a ignorarem riscos vinculados a uso indiscriminado e não supervisionado
Anelise Valente
A era da transformação digital popularizou um enorme conjunto de ferramentas que automatizam atividades e processos, como as ferramentas de Inteligência Artificial Generativa, utilizadas para a criação de conteúdo sobre os mais variados temas. Isso gerou um crescimento exponencial da utilização de IA em ambientes corporativos.
Esse movimento crescente relacionado ao uso de IA é óbvio e natural, considerando o momento tecnológico vivenciado pela sociedade. Associado a esse momento histórico social, a disseminação dessas ferramentas também se deve ao seu baixo custo (muitas com opções gratuitas e entregas excelentes), à acessibilidade e à facilidade de uso.
Mas, seria a IA generativa um vilão corporativo incompreendido?
Como toda solução tecnológica deve ter os riscos de implementação e utilização muito bem mapeados, o uso de IAs dentro de qualquer corporação também deve ser avaliado com cautela, pois pode representar uma ameaça à segurança dos dados empresariais.
Evidente que o uso dessas ferramentas no ambiente empresarial não poderá ser suprimido, inclusive, aqueles que forem por esse caminho com certeza terão apenas um destino: o atraso em relação à concorrência, pois chegará o momento em que terão que se adaptar e já estarão atrás dos que, para além do uso, estejam fazendo de forma correta e com maior segurança.
Isso porque essas ferramentas, quando utilizadas de maneira eficaz, certamente trazem benefícios relacionados ao aumento da produtividade e à redução de custos; melhoram o relacionamento com o cliente, em razão do aumento da eficiência e agilidade na entrega; e promovem a possibilidade de se analisar dados em larga escala com maior assertividade e em menos tempo.
O que não se pode deixar ocorrer é que a comodidade excessiva leve a empresa a ignorar os riscos vinculados ao uso indiscriminado e não supervisionado da IA. Portanto, não, a IA não é um vilão incompreendido, mas o seu uso incorreto, indiscriminado e sem supervisão pode sim trazer problemas complexos à empresa.
Ora, como toda e qualquer atividade, o uso dessas ferramentas de IA traz algumas vulnerabilidades, dentre as quais, pode-se listar:
– O treinamento das ferramentas com dados dos usuários, muitas vezes, sensíveis e que estarão sendo liberados em nuvem pública; – Dados sigilosos serem armazenados externamente sem a necessária segurança, bem como, serem reaproveitados indevidamente; – O desrespeito às regras da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), especialmente, quando não se tem a certeza de que a plataforma utilizada adere a todos os princípios da norma.
Reforçando a existência desses riscos, seguem casos reais de vazamentos pelo uso de IA (https://g1.globo.com/pr/parana/especial-publicitario/bw8/noticia/2025/03/14/vazamentos-de-dados-a-ameaca-silenciosa-das-ias-genericas-na-empresas.ghtml):
- Indústria Farmacêutica: Estratégia de lançamento de um medicamento inédito vazou após uso de IA para simular cenários de mercado;
- Varejo: Dados de 240 mil clientes de um e-commerce foram expostos via relatórios gerados por ferramenta de marketing automation;
- Setor Financeiro: Algoritmo de crédito de um banco foi replicado por concorrentes após uso de IA pública para análise de risco.
Analisando-se os exemplos reais trazidos, evidencia-se a ocorrência de eventos graves como espionagem, vazamento de dados importantes e estratégicos para negócio, concorrência desleal, sanções administrativas, processos judiciais e mácula na reputação e imagem da empresa decorrentes do uso indevido de ferramentas de IA. Ou seja, as empresas que negligenciarem a segurança adotando ferramentas de IA genéricas sem critério estarão correndo riscos administrativos, legais, reputacionais e financeiros. Portanto, a gravidade dessas consequências não pode ser ignorada.
Para tanto, a empresa precisa buscar formas de mitigar os riscos, mas se manter competitiva no mercado, utilizando-se do binômio risco x benefício, ao passo que, necessariamente, as soluções demandarão dispêndio financeiro.
Uma possibilidade é o investimento interno em soluções de IA customizadas, treinadas com dados internos e hospedadas em ambiente seguro. Criadas com total respeito às normas aplicáveis e mantidas sob supervisão da equipe especializada de TI.
Ainda, implementar políticas claras e rígidas de Governança de Dados e Cibersegurança – que irão definir como a empresa gerencia seus dados e quais as práticas utilizadas para proteger as informações internas – e, também, investir na conscientização e treinamento constante e renovável da equipe de colaboradores, sempre apresentando a todos, de forma clara e direta, quais os riscos envolvidos com o uso de IAs genéricas, sem controle e sem supervisão.
Importante concluir reforçando-se que as ferramentas de Inteligência Artificial são grandes aliadas, porém, sua utilização no ambiente corporativo deve ser incentivada desde que de maneira estratégica, segura e sempre orientada pela proteção das informações lançadas nas plataformas.
Anelise Valente é advogada no escritório Rücker Curi Advocacia e Consultoria Jurídica.